O Ministério Público Federal em São Paulo vê “elementos concretos de
possível prática de delito” envolvendo o senador José Sarney (PMDB-AP)
no emblemático episódio do Banco Santos – em novembro de 2004, segundo o
MPF, por sua “relação estreita” com o então banqueiro Edemar Cid
Ferreira, controlador da instituição, Sarney teria se beneficiado,
resgatando R$ 2,159 milhões (em valor da época) antes de o Banco Central
decretar intervenção.
Em manifestação de 48 páginas, o MPF
deixa a critério da Procuradoria-Geral da República eventual
enquadramento penal de Sarney. O documento destaca que a data do saque
ocorreu “apenas um dia antes da intervenção” e aponta a “proximidade de
Sarney com Edemar, amigos íntimos há mais de 3 décadas”. A Procuradoria
da República pede à Justiça Federal que remeta os autos para o Supremo
Tribunal Federal (STF), corte que detém poder constitucional de
processar e julgar senadores.
O MPF
assinala que o banqueiro e sua mulher são padrinhos de casamento da
filha de Sarney, a governadora Roseana Sarney (PMDB), do Maranhão. Cita o
depoimento de uma ex-executiva do Banco Santos, que afirmou ter
recebido um manuscrito contendo instruções para efetivação do resgate,
“documento este que se apurou ter sido escrito por Edemar, entre outros
elementos constantes da apuração da Comissão de Valores Mobiliários
(CVM)”.
A intervenção do BC alcançou o
Banco Santos e a Santos Corretora de Câmbio e Valores devido “ao
comprometimento da situação econômico-financeira” da instituição. O BC
comunicou rombo de R$ 2,3 bilhões e perda de liquidez no banco de
Edemar.
A Polícia Federal abriu
inquérito. Em dezembro de 2006, o banqueiro foi condenado a 21 anos de
prisão por quadrilha, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta.
Indignado, Edemar reagiu às acusações e recorreu ao Tribunal Regional
Federal.
A CVM analisou em que
condições foram realizados os resgates mais representativos em termos
financeiros nos fundos sob administração do Banco Santos na semana de 8 a
12 de novembro de 2004 e se houve insider trading – informação
privilegiada – e favorecimento a cotistas que evitaram perdas.
Sarney
era cotista exclusivo do Fundo Titanium FAQ, que aplicava suas cotas no
Santos Credit Yield FIF e Santos Credit Master FIF. Do valor resgatado,
R$ 2.059.541,91 foram para a conta do senador no Banco do Brasil e
R$100 mil para sua conta no próprio Banco Santos. A transferência
ocorreu no dia 11 de novembro de 2004, um dia antes da intervenção.
À
CVM, Sarney afirmou não ter recebido informação privilegiada e que uma
das razões que o levaram a retirar os recursos é que era fato “público e
notório” que o banco atravessava “dificuldades financeiras”. Outra
justificativa para o desinvestimento feito no Titanium FAQ, anotou
Sarney, residiu no fato de a gerente de conta que o atendia há bastante
tempo e que cuidava de seus recursos, Fernanda Amendola Bellotti, ter
sido demitida no início de novembro de 2004.
A
CVM arquivou a apuração por “não ser possível construir e respaldar uma
acusação de uso indevido de informação privilegiada em face do cotista
José Sarney”.
Mas o MPF vê indícios de
crime. “Embora estejamos diante de ‘valores mobiliários’ caberá ao
procurador-geral da República e ao STF analisar o enquadramento típico
da conduta (de Sarney).”
Outro lado. O
senador José Sarney (PMDB-AP), por sua assessoria, reiterou as
declarações que prestou à Comissão de Valores Mobiliários. Ele disse
acreditar que “a prova de que o assunto não tem fundamento está no
arquivamento do procedimento pela CVM”. O banqueiro Edemar Cid Ferreira,
ex-controlador do Banco Santos, preferiu não se manifestar sobre o
episódio.
Por John Cutrim
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